O que a Guerra na Ucrânia nos ensina sobre liderança?
No cenário corporativo, histórias de liderança baseada no medo, na centralização total das decisões e na falta de habilidade para lidar com temas complexos são bastante comuns. Em alguns casos, chefes adotam posturas rígidas e controladoras que, à primeira vista, podem dar uma impressão de força e autoridade. Entretanto, essa atitude pode ser uma armadilha perigosa. A história recente, especialmente com figuras como Vladimir Putin, nos mostra que esse estilo de liderança tem consequências desastrosas e muitas vezes irreversíveis, seja para uma nação ou para uma organização. A analogia entre líderes empresariais autoritários e governos absolutistas, como o de Putin, pode parecer extrema, mas as semelhanças são evidentes e merecem uma análise cuidadosa.
O Perigo do “Sim, Senhor” e a Cultura da Obediência Cega
No regime de Putin, o controle centralizado e a imposição de uma verdade única criaram um ambiente onde seus assessores não se sentiam à vontade para expor realidades. Esse tipo de liderança, que desconsidera perspectivas alternativas e impõe um pensamento unilateral, pode surgir também em ambientes corporativos, levando a um fenômeno conhecido na administração como “grupalismo” ou groupthink.
Groupthink ocorre quando uma equipe ou grupo de pessoas suprime suas opiniões para manter uma sensação de consenso e harmonia, muitas vezes por medo de represálias. Nesse cenário, críticas construtivas e perspectivas divergentes, cruciais para a inovação e a resolução de problemas, acabam sendo desconsideradas. Em regimes ou empresas que centralizam o poder, um chefe que não aceita questionamentos cria um ambiente de “sim, senhor”, onde todos, temendo as consequências, preferem omitir problemas ou discordâncias. Essa harmonia forçada, porém, é uma fachada que esconde fragilidades que, mais cedo ou mais tarde, serão expostas.
O Chefe que Ouve, mas Não Ouve de Verdade
Em alguns casos, o problema não está em não escutar, mas em escutar sem intenção de agir. Esse é o perfil do chefe que recebe feedbacks, críticas e ideias de sua equipe com uma postura de aparente atenção, mas que na prática utiliza essa escuta apenas para catalogar os mensageiros. Ou seja, a partir do momento em que alguém se expõe para apontar uma falha ou propor uma mudança, ele não é valorizado pela contribuição, mas rotulado como alguém “reclamão” ou “difícil”. Isso gera uma desconexão entre o chefe e a equipe, onde o chefe passa a enxergar aqueles que trazem críticas como desestabilizadores, em vez de colaboradores engajados.
O resultado é uma equipe desmotivada, que rapidamente aprende que, independentemente do que diga, nada será alterado. Esse ciclo vicioso leva os colaboradores a silenciar suas opiniões e a deixar de apontar problemas. O chefe, por outro lado, mantém a falsa sensação de controle, achando que o ambiente está pacífico e que não há questões a serem resolvidas. Isso ocorre porque os profissionais que poderiam alertá-lo sobre problemas são os mesmos que ele ignorou e desqualificou. Como consequência, a organização perde a chance de melhorar, e os problemas se acumulam silenciosamente.
O Chefe que Não Domina o Assunto e Simplifica o Complexo
Outro tipo de liderança problemática surge quando o chefe não possui o conhecimento técnico ou específico das áreas que gerencia. Esse tipo de líder adota uma postura de aparente segurança e reduz a complexidade dos problemas, convencido de que sua visão limitada é suficiente. No entanto, ao simplificar questões complexas que ele não consegue entender totalmente, o líder cria barreiras para o desenvolvimento da equipe e para a resolução dos problemas reais.
Esse comportamento resulta em decisões mal fundamentadas, pois ele subestima a complexidade do trabalho dos subordinados e frequentemente desconsidera as soluções sugeridas, acreditando que elas complicam o que deveria ser simples. O chefe sem domínio técnico acredita que “é só fazer assim”, “é só dar um jeito”, mas não compreende que as soluções rápidas e fáceis não se aplicam a contextos complexos. Esse tipo de liderança não só ignora a profundidade das questões, como também desvaloriza o conhecimento da equipe, criando um ambiente onde os profissionais passam a se sentir desrespeitados e subestimados.
A Ilusão de Força e Liderança em Ambientes Autoritários
A centralização do poder em figuras autoritárias cria a ilusão de que tudo está sob controle. Na Rússia, Putin pode ter acreditado que, ao silenciar vozes críticas, mantinha o país estável e seguro. Em um contexto corporativo, o líder que insiste em fazer tudo sozinho, simplificando o que não entende e ignorando os alertas, também acredita que essa estratégia é um sinal de força e de liderança. Mas, em ambos os casos, a verdade é que a organização, seja ela um país ou uma empresa, se torna frágil e ineficaz.
Em ambientes onde não há espaço para o diálogo e onde o líder simplifica o complexo, os problemas são mascarados e acumulados. O líder toma decisões com base em informações incompletas ou distorcidas, levando a escolhas desastrosas. Ao mesmo tempo, a equipe perde a motivação para contribuir e deixa de se sentir responsável por melhorias, pois vê que todo esforço para mostrar a realidade acaba sendo em vão.
A Cultura do Feedback e a Necessidade de Espaço para Verdades
No lugar de uma liderança absolutista, empresas devem cultivar uma cultura de feedback real. O feedback honesto e construtivo permite que o líder e sua equipe enxerguem os desafios de diferentes ângulos, essencial para a inovação e o crescimento. Empresas que incentivam a comunicação aberta e segura conseguem corrigir problemas antes que eles se tornem crises. Líderes que acolhem feedbacks genuínos, em vez de verem críticas como ameaças, fortalecem a confiança e mantêm a organização dinâmica e conectada à realidade.
Construindo uma Liderança Sustentável
Para que uma empresa seja bem-sucedida e sustentável, ela precisa de líderes que não se intimidem com o contraditório e que reconheçam a complexidade de suas áreas de atuação. A liderança sustentável é aquela que valoriza o aprendizado contínuo e a troca de experiências. O líder não precisa estar sempre certo; ele precisa estar aberto a aprender. Essa postura transforma a autoridade em respeito genuíno e fortalece o espírito de equipe.
Lideranças centralizadoras e autoritárias podem até se manter por um tempo, mas cedo ou tarde, a ausência de debate e a simplificação da realidade se tornam insustentáveis. A história de líderes absolutistas, como Putin, nos ensina que uma liderança construída em cima do medo e do autoritarismo pode até impressionar no início, mas, em longo prazo, não resiste às exigências de um mundo dinâmico e competitivo.
Assim, para que os chefes não caiam na armadilha de serem os últimos a saber dos problemas de sua equipe ou de simplificar o que é complexo, é essencial que cultivem uma liderança aberta, fundamentada em humildade e na comunicação honesta. Só assim, evitando o isolamento e aceitando o feedback como uma ferramenta de crescimento, é possível construir uma organização realmente resiliente e inovadora.